sábado, junho 26, 2004

O aço dos cravos

Uma bandeira perturba o vazio no escuro da sala, deixando as cadeiras na interrogação perene do futuro. E um timbre silencioso relembra-me a cor sinistra do sangue.

Vou-me sentar um pouco nos ponteiros do tempo.

Reparo que estou ainda acordado no meio da vida. Reparo que faço uma estrada desse silêncio líquido que o hino repara.

Sou um segundo de um mar de espuma.

Reparos de uma parada num degrau de uma escada. Centavos que escrevo enquanto me conheço no aço dos cravos.

Uma perna macia permite algumas alegrias luminosas nas rosas. Basta-me uma vitória para percorrer a relva que me leva para ti.


sexta-feira, junho 18, 2004

O Sol da Semente

Vive uma semente com origem num rio, na mais doce espuma da alma, entre nós há um sol de Fevereiro em flor.

Uma voz ainda ausente mas presente quando a luz se sente.

Conheço as minhas mãos e a viagem que perfaz o som do destino. A melodia que elas criam na tua pele aquecem as pétalas dessa origem benévola.

Uma chama dilacera devagar as tristezas do tempo. Ainda te sinto como um sino na praia do castelo.

Todas as noites eu tenho no corpo uma verdade, uma herdade, uma penumbra que morre numa montanha.

A ondulação da voz na rosa de um jardim, entre o jogo da vida.

Há nove livros para ler em lençois pretos e brancos, mas eu assino o sinal com uma cor transparente, essa minha e tua semente.

Um sorriso no sol que se sente.


domingo, junho 13, 2004

A Lealdade da Lingerie

Deixo de ser até onde a lâmina termina, depois vem o tempo no vento do teu corpo. E acorda-me novamente.

Assimilo as sementes das flores pálidas que desenham os grafitis.

Volto a encontrar-te num condor de uma gôndola que permeia o quente lento. Continua esse comportamento estranho nos pássaros que me satisfaz.

Todas as mulheres do mundo vivem num perfume que segrega na tua pele húmida. Sinto esse cheiro quando te toco nas cinzas.

Um sumo de melodia transparece no grito do dia translúcido.

E os poetas que ninguém conhece continuam a olhar esse voo anormal das nuvens, a escutar o pólen da inquietude nos gatos intranquilos .

Por vezes, a lingerie que se encontra na nudez da noite é a alma mais humana, no mundo das coisas inertes.

Aprecio cantar essa lealdade animal sobreposta à materia dos objectos.


quarta-feira, junho 09, 2004

A mutação da Esfera Armilar


De ontem para hoje uma vegetação marítima transporta-me numa alga de sal temperado. E um descobrimento acorda-me na mutação dos gritos pátrios.

Sou ainda português.

Há fogos não apreendidos que respiram no peito da saudade. E pelo corpo da alma fazemos um estaleiro com os músculos desfiados.

Tentamos uma cor de tinteiro dual na montanha da penumbra.

Neste dia esférico, como no anterior e no seguinte passo para uma relva vulgar e húmida seiva lusa. Esquecemos as viagens da esfera armilar.

Esquecemos o esforço. As horas e o tempo que o ouro levou ao tempo.

Trocámos a exaustão do oceano pelo coração, mas há ainda laços tranquilos de braços pretos. Há redes de pesca na bandeira enérgica do corpo.

Sou um peixe salgado.

Sou um anzol fácil.